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Bitola métrica ou larga
Um estudo do ponto de vista econômico das ferrovias (I)
Délio Araújo
Centro-Oeste nº 15 (Abril-Maio/1986)
A área dos transportes ferroviários constitui uma das mais fascinantes da economia dos transportes, exatamente porque, na análise
de situações concretas, muitas vezes são ignoradas ou são colocadas em segundo plano os aspectos e as implicações
econômicas, preferindo-se antepor-lhes os aspectos e as implicações técnicas e políticas.
Um dos pontos básicos, no caso específico da economicidade dos sistemas ferroviários de bitolas desiguais, é
a definição de qual bitola deverá ser adotada como padrão dentro dos critérios econômicos.
Este problema interessa não apenas ao Brasil, cuja rede comercial opera duas bitolas, a larga (1,600 m) e a métrica (1,000
m). A EF Amapá, por seu isolamento, pode ser deixada de lado, com sua bitola padrão (1,435 m).
A Argentina (bitolas métrica, 1,435 m e 1,670 m), a Austrália (1,067 m, 1,435 m e 1,670 m), a Índia (1,000 m e 1,670
m), a Espanha (1,000 m e 1,670 m), a Suíça (1,000 m e 1,440 m), além de muitos outros países, apresentam sérias
dificuldades de intercâmbio devido à quebra de bitolas.
No Brasil, a bitola oficial e legal é de 1,600 m, desde o governo Médici. No entanto, em termos de economicidade real são
bastante discutíveis os motivos que levaram a essa escolha.
Em primeiro lugar, a bitola métrica pode operar trens tão compridos e pesados como qualquer outra bitola mais larga. Exemplo
temos em casa, a EF Vitória a Minas (métrica), que nada fica a dever à sua irmã EF Carajás (1,600 m). Antes,
parece que a economia operacional comparada favorece, ligeiramente, a bitola métrica.
Fora do Brasil, temos a linha de Saldanha Bay, na África do Sul, com seus trens de mais de 20.000 toneladas, elevado peso por eixo
e notável economia operacional, em pé de igualdade com a formidável Duluth, Missabe and you Range, a campeã americana
e mundial nessa categoria de transporte. Nessas três linhas, prepondera o escoamento de minério de ferro.
No caso do carvão, os trens mais pesados fora dos EUA (1,435 m), Canadá (1,435 m) e URSS (1,520 m) circulam no Estado de Queensland,
Austrália (1,067 m). Em carga geral, os trens da África do Sul (1,067 m), mesmo empregando o freio a vácuo, colocaram-se
abaixo dos EUA e Canadá, e à frente de todos os países europeus.
O que mais interessa, em economia dos transportes, é o gabarito útil dos veículos.
Por exemplo, o gabarito útil do material rodante de carga da bitola métrica brasileira oferece maior capacidade de oferta de
espaço e de peso que a maior parte das ferrovias européias, asiáticas e africanas. O Japão (1,067 m) opera vagões-cegonha
de dois andares, destinados ao transporte de automóveis.
Em segundo lugar, o que mais contribui para a economicidade do êxito comercial de um sistema ferroviário é a uniformidade
da bitola. Não é a bitola como tal. Mais interessa o escoamento fácil, rápido e confiável do tráfego,
do que propriamente a bitola. Por isso, a uniformização da bitola deve dar-se na direção daquela bitola que oferece
menores custos de uniformização, manutenção e operação.
Nesses três aspectos, a bitola métrica concorre favoravelmente com qualquer outra uniformização.
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É mais barato simplesmente colocar um trilho interno para estreitar a bitola do que alargar cortes, aterros, pontes
etc., para alargar a bitola mediante um trilho externo.
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Na manutenção, é mais barato trabalhar com menor volume de lastro, menor desgaste de trilhos (especialmente
nas curvas), menores dimensões e peso dos dormentes etc.
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Na operação, é mais interessante economizar em termos de resistências (e, conseqüentemente,
em termos de energia)...
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No investimento, tanto inicial como de reposição, pode-se economizar tanto mais quanto mais estreita é
a bitola.
O que, em sentido mercadológico, torna eficientes os sistemas ferroviários americano-canadense, inglês, europeu ocidental,
sul-africano, japonês (excluindo-se o Trem Bala, é claro), é:
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A cobertura espacial dos mercados nacionais e internacionais a que servem; e
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A uniformidade da bitola, e não a sua largura.
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